sexta-feira, 8 de maio de 2009

Sol e Chuva

Texto que fiz essa semana para a PUC.
A proposta era escrever em flashback.

Quando se deu conta, seu corpo já estava no chão. Quebrou o fêmur. Olhando ao redor, percebeu que estava dentro de uma ambulância. Também notou ferimentos, mas – pensou – menos mal, sobrevivera.
Soube depois que contou com a ajuda dos passantes que o viram escorregar e perder os sentidos. Foram eles que chamaram os bombeiros que lhe prestaram socorro. Talvez tenha ficado caído por vinte minutos. Quem poderia, com precisão, dizer-lhe o tempo exato?
Lembrava-se da cena: deitado em berço nada esplêndido. Em sangue. O enfermeiro da ambulância até que tentou fazer graça. Desgraça. No momento do acidente ele estava melancolicamente filosófico e agora, a caminho do hospital, continuava a colher pensamentos esparsos; sentia-se intempestivo como o amor e a morte. O que mais desejava era burlar toda aquela logística médica e retornar à vida. Achar o mar, o mar, o mar...
Sua memória desembrulhava pingos de chuva em frente ao mar em que sua musa, tão linda, surgia como um presente naquelas tardes nubladas. “Sol e chuva: casamento de viúva”, memórias da infância invadiam o cenário amoroso dos adultos.
Namoravam baixinho. Beijos molhados, silenciosos como as marolas que percorriam seus corpos. Partiria com sua Iemanjá? Entraria com ela pelas veias dos rios para morar nas águas doces de algum secreto reino? Desejos concretizados à sombra dos coqueirais. Aquele paraíso tinha de fato paisagem muito furtiva.
Os amantes sabiam que cada encontro poderia ser o último e aquele momento logo passaria. Não duraria mais do que a chuva. Em pouco tempo todos sairiam de suas casas, inclusive o marido, homem rico, poderoso e incapaz de proporcionar-lhe o amor. Ninguém mais era capaz de presenteá-la com a fluidez do mar.
Ele se perdia na cantiga que vinha do corpo de sua sereia. Abraços descansavam na luz da tarde. O fogo se alastrava de suas veias e perdia-se no horizonte. Como Ceci e Peri, eles se amavam porque seus olhos escuros se faziam claros. Tiraram suas roupas. Aqueles panos atrapalhavam a vibração do sol.
Entre coqueiros, areia e água houve um rito sacro-profano, memória de uma fertilidade antiga, repetição arcaica e ao mesmo tempo inédita dos rituais de iniciação. Amaram-se. O orgasmo provocou dor em alguma parte inacessível do seu ser. Perdeu-se de vista.
Quando se deu conta, seu corpo estava no chão. Sentia frio e fome quando perdeu o equilíbrio, o tempo e o espaço. Caiu no asfalto encharcado. As vozes do Centro da cidade se misturavam ao vulto do marido que ainda podia ser visto por ele correndo. Aquela imagem tornou sua dor ainda mais intensa. Sentiu-se completamente incapaz de reerguer-se tanto para a vida quanto para o amor.
Depois de tantas cicatrizes, sangramentos, infecções, perigos e incertezas, como se fazer novamente um homem? Não por acaso aquela tarde também era nublada. Seu corpo exposto na rua, sua sorte desamparada. Isso era tudo o que ele tinha no momento.
Mesmo assim a vida lhe trouxe um velho presente: pequenos raios de sol reacenderam sua memória: “sol e chuva, casamento de viúva”. E no percurso da ambulância ao hospital, sua musa novamente o acompanhava numa viagem povoada de incertezas.

domingo, 15 de fevereiro de 2009

sexta-feira, 13 de fevereiro de 2009

Pintando nas telas

Há pouco tempo tive a grata surpresa de assistir a um filme do diretor e também ator Ed Harris chamado Pollock, que conta a vida do pintor americano Jackson Pollock. O filme me emocionou pela vida intensa do artista e por sua dificuldade de expressar suas convicções e visão de mundo. Pensei nos outros filmes que já tinha visto sobre pintores. Enquanto uns são apenas biográficos, outros tentam mostrar ao espectador, principalmente através da fotografia, a forma com que o artista trabalha sua pintura. Filmes desse tipo às vezes me leva a pensar que a vida, de alguma forma, é como um pássaro privado de liberdade.
Organizei informações sobre alguns filmes que retratam a vida ou obra de pintores.
Tirem suas próprias conclusões.



Pollock (2000)
Título original: Pollock
Site: www.sonyclassics.com/pollock
Direção: Ed Harris
Roteiro: Barbara Turner e Susan Emshwiller
Elenco: Ed Harris (Jackson Pollock), Marcia Gay Harden (Lee Krasner), Amy Madigan (Peggy Guggenheim), Jennifer Connelly (Ruth Klingman)



Caravaggio (1986)
Título original: Caravaggio
Direção: Derek Jarman
Roteiro: Nicholas Ward Jackson, Derek Jarman, Suso Cecchi d'Amico
Elenco: Nigel Terry, Sean Bean, Noam Almaz, Dexter Fletcher, Jack Birkett, Sadie Corre, Tilda Swinton, Garry Cooper



Basquiat (1996)
Título original: Basquiat
Site: www.miramax.com/basquiat
Direção: Julian Schnabel
Roteiro: Julian Schnabel
Elenco: Jeffrey Wright (Jean Michel Basquiat), Michael Wincott (Rene Ricard), Benicio Del Toro (Benny Dalmau), Claire Forlani (Gina Cardinale), David Bowie (Andy Warhol), Dennis Hopper (Bruno Bischofberger), Gary Oldman (Albert Milo), Christopher Walken (Entrevistador), Courtney Love (Big Pink)


















Frida (2002)
Título original: Frida
Site: www.miramax.com/frida
Direção: Julie Taymor
Roteiro: Clancy Sigal, Diane Lake, Gregory Nava e Anna Thomas
Elenco: Salma Hayek (Frida Kahlo), Alfred Molina (Diego Rivera), Geoffrey Rush (Leon Trotsky), Ashley Judd (Tina Modotti), Antonio Banderas (David Alfaro Siqueiros), Edward Norton (Nelson Rockfeller)




Os amores de Picasso (1996)
Título original: Surviving Picasso
Direção: James Ivory
Roteiro: Ruth Prawer Jhabvala
Elenco: Anthony Hopkins (Pablo Picasso), Natascha McElhone (Françoise Gilot), Julianne Moore (Dora Maar), Joss Ackland (Henri Matisse), Dennis Boutsikaris (Kootz)



Sombras de Goya (2006)
Título original: Goya's Ghosts
Site: www.goyasghoststhefilm.com
Direção: Milos Forman
Roteiro: Milos Forman e Jean-Claude Carrière
Elenco: Javier Bardem (Irmão Lorenzo), Natalie Portman (Inés / Alicia), Stellan Skarsgard (Francisco Goya), Randy Quaid (Rei Carlos IV), Blanca Portillo (Rainha Maria Luísa), Michael Lonsdale (Padre Gregorio), José Luís Gómez (Tomás Bilbatúa), Mabel Rivera (Maria Isabel Bilbatúa)



Agonia e êxtase (1965)
(filme sobre Michelangelo)
Título original: The Agony and the Ecstasy
Site: www.2001video.com.br
Direção: Carol Reed
Roteiro: Philip Dunne
Elenco: Charlton Heston, Rex Harrison, Diane Cilento, Harry Andrews, Alberto Lupo, Adolfo Celi, Venantino Venantini, John Stacy, Fausto Tozzi, Maxine Audley












O mistério de Picasso (1956)
Título original: Le mystère Picasso
Diretor: Henri-Georges Clouzot
Roteiro: Henri-Georges Clouzot
Elenco: Pablo Picasso, Henri-Georges Clouzot, Claude Renoir



Moça com brinco de pérola (2003)
(filme sobre Vermeer)
Título original: Girl with a Pearl Earring
Site: www.girlwithapearlearringmovie.com
Direção: Peter Webber
Roteiro: Olivia Hetreed
Elenco: Colin Firth (Johannes Vermeer), Scarlett Johansson (Griet), Tom Wilkinson (Van Ruijven), Judy Parfitt (Maria Thins), Cillian Murphy (Pieter), Essie Davis (Catharina)


















Goya (1999)
Título original: Goya en Burdeos
Site: www.spe.sony.com/classics/goyainbordeaux
Direção: Carlos Saura
Roteiro: Carlos Saura
Elenco: Francisco Rabal (Goya), José Coronado (Jovem Goya), Daphne Fernández (Rosario)
Maribel Verdú (Duquesa de Alba), Eulalia Ramón (Leocadia), Joaquín Climent (Moratin)



Sede de viver (1956)
(filme sobre Van Gogh)
Título original: Lust for Life
Direção: Vincente Minnelli
Roteiro: Norman Corwin
Elenco: Kirk Douglas (Vincent Van Gogh), Anthony Quinn (Paul Gauguin), James Donald (Theo Van Gogh), Pamela Brown (Christine), Everett Sloane (Dr. Gachet), Niall MacGinnis (Roulin), Noel Purcell (Anton Mauve), Henry Daniell (Theodorus Van Gogh), Madge Kennedy (Anna Cornelia Van Gogh)



Modigliani - Paixão pela vida (2004)
Título original: Modigliani
Direção e roteiro: Mick Davis
Elenco: Andy Garcia, Elsa Zylberstein, Hyppolyte Girardot, Omid Djalili, Eva Herzigova, Miriam Margolyes





El Greco (2007)
Título original: El Greco
Diretor: Yannis Smaragdis
Roteiro: Jackie Pavlenko, Dimitris Siatopoulos
Elenco: Nick Ashdon, Juan Diego Botto, Laia Marull, Lakis Lazopoulos, Dimitra Matsouka, Sotiris Moustakas, Dina Konsta, Giorgos Hristodoulou, Dimitris Kalivokas, Yorgos Charalabidis, Theo Zouboulidis¹, Lida Protopsalti, Katerina Helmy, Fermí Reixach, Roger Coma

segunda-feira, 2 de fevereiro de 2009

Rize, filme sobre o movimento Krump

Semana passada vi um documentário no Telecine Cult que me chamou muita atenção: Rize, uma produção dos EUA e do Reino Unido, com direção do fotógrafo de moda David Lachapelle.
O filme mostra a evolução da clown dancing (a dança do palhaço) até o surgimento do Krump, um tipo de dança de rua feita com movimentos rápidos e agressivos semelhantes a uma luta. Posteriormente o Krump originou o buck style, estilo que ressaltou as pinturas faciais e movimentos parecidos com os de tribos ancestrais africanas.
O estilo destes grupos é muito parecido com os brasileiros AfroReggae e Timbalada, por exemplo, e a semelhança entre eles supera o aspecto visual. O grande diferencial está na catarse de transformar reflexos da violência em uma nova forma de vida para estes jovens dançarinos.
O precursor do movimento Krump é um ex-traficante conhecido como Tommy, o palhaço, daí o termo clown dancing. Ele já utilizava um visual teatral, com pinturas faciais e uma peruca black power colorida. Tommy incentivou aos jovens do bairro violento de South Central, Los Angeles, a largar a vida de gangues ligadas ao tráfico para ingressarem no mundo da cultura através da dança.
O que mais me chamou atenção no filme é o poder da dança e da arte em geral de reabilitar jovens. A sensibilidade do diretor mostrou um movimento social feito com o coração, com muita verdade, num resultado comovente na tela. Quase todas as coreografias apresentadas no filme foram filmadas sem ensaio prévio. Inserido do cotidiano daqueles jovens, o diretor conseguiu alcançar alto grau de sinceridade e espontaneidade dos artistas.
Rize recebeu o prêmio de melhor documentário no Festival de Bangkok em 2006. É com certeza um trabalho que merece muito ser visto.

Na foto, o palhaço Tommy.






E abaixo, no primeiro vídeo o Krump. No segundo, coreografias de tribos africanas. Reparem na semelhança!




Do inferno ao céu



Abro o céu de Rimbaud em Vila Isabel, ouvindo Milagreiro, com Cássia Eller e Djavan, olhando as montanhas mágicas que formam a Floresta da Tijuca. É sempre um prazer degustar o manjar da vida.
Com este blog, inauguro um espaço para compartilhar reflexões pessoais com os amigos e com todos que por aqui passarem.
O céu de Rimbaud saúda a existência de sorrisos, suores, tendências, amores, encontros e desencontros.
Bem-vindos sejam... sejam bem-vindos!

Começaria tudo outra vez